terça-feira, 2 de novembro de 2010

Liberdade, independência e roupas a secar

Estabeleci meu conceito de liberdade e independência com os pregadores de roupas. Exatamente assim. Quero uma casa grande, alta, ventilada e com espaço para meu filho correr e inventar mundos ao meu redor. Quero continuar sendo criança adulta para ele, uma missão mais que valiosa que assumi ainda menina e, à força, me fiz mulher diante dos fatos.
Os pregadores de roupas são a conseqüência do meu esforço por uma vida independente: um dia, não muito distante, os comprarei para minha casa. Acho o ato máximo de liberdade eu ter meus próprios pregadores, grampos coloridos que irão se perder, multifacetados e infiéis a mim. Meus pregadores, minhas roupas em meu varal!
Este dia glorioso povoa minha imaginação: eu chego em casa, roupas leves num sábado ensolarado (o sol no sábado é mais gostoso, menos agressivo e sempre vem acompanhado de música), pego uma singela peça de roupa molhada, estendo sobre o varal e, com meu pregador, fixo a mesma no tal ato máximo de liberdade. Eu comprei o pregador, ele me obedece, somos moradores dessa mesma casa, posso deixá-lo organizado no varal, solto ao chão, grudado na roupa já seca... posso chorar um dia pregando as roupas, ele, meu confidente.
Num dia qualquer minha raiva pode ser descontada num pregador verde, numa ira sem sentido, arremessado violentamente contra a parede. Ele, mais forte que eu, vai rir do meu ato insano, e vai mostrar que aquilo não serviu pra nada. Vai me observar chorar arrependida, envergonhada de todo o teatro dramático daquele instante, e voltará às minhas mãos, como o meu querido pregador de roupas, a quem posso ser livre. Não existe nada mais vivo e real que colocar as roupas para secar. Nem nada mais livre que ter meu próprio pregador de roupas, no modelo adequado às minhas necessidades, nas cores que desejo, no mundo que construi para mim.

4 comentários:

George Dantas disse...

"Muitas vezes nos preocupamos tanto em sair do ninho, que nos esquecemos de como pode ser frio lá fora."

Pregadores de roupa não servem apenas para substituir botões!

Francisco de Sousa Vieira Filho disse...

Eu quero minha própria caverna... já cansei daquela que me deram por abrigo os meus pais... quero edificá-la como queira... mas quero a ingenuidade e a ausência dos problemas como na infância, quando habitava na caverna deles inconsciente de na caverna estar, exceto pelos problemas de criança, que normalmente são os melhores [e provável maiores até]... independência e liberdade parecem inconciliáveis... é que se quer o prega-dor [de roupa, de pele, de alma...], algo que nos livre daquilo que de mais íntimo nos une e nos faz humanos: a dor que teima e pulsa e nos fita, mesmo quando em silêncio, e nos junge...

L-nise disse...

E a raiva tinha que ser descontada no pregador VERDE. Tua cara mesmo :]

texto-bom-de-se-ler

andreia r disse...

eu lavo minhas roupas... mas os pregadores não são meus... liberdade limitada existe?